Mauro Benevides Filho |
Caso o pré-candidato do PDT à Presidência da República, Ciro Gomes, vença a eleição pelo Palácio do Planalto, Mauro Benevides Filho deve se tornar o seu ministro da Fazenda. Economista pela Universidade de Brasília (UnB) e doutor pela Vanderbilt, nos Estados Unidos, ele, há 12 anos, é secretário de Fazenda do Ceará em governos de diferentes partidos, atualmente com o petista Camilo Santana.
Benevides e Ciro têm pressa. Não querem esperar a eleição. Para a Previdência, eles vão propor até o fim de julho um plano detalhado, com a redução do teto, atualmente em R$ 5.645,80, para algo em torno de R$ 4 mil. Os trabalhadores, incluindo servidores, teriam direito também a uma conta individual de fundo de pensão, que receberia contribuição do empregador. Com isso, diz ele, será possível ao aposentado receber mais que o teto atual e, ao mesmo tempo, reduzir o peso para as empresas.
Mesmo que isso seja aprovado, os efeitos na melhora das contas públicas vão demorar para aparecer, mas o economista promete reduzir o déficit primário, de R$ 124 bilhões em 2017, em apenas dois anos. “Não existe social sem quadro fiscal ajustado”, afirma. Benevides pretende, por exemplo, eliminar 15% da renúncia fiscal que existe hoje, o que reduziria o déficit público em R$ 45 bilhões.
A distribuição de lucros e dividendos passaria a ser taxada, proporcionando outros R$ 49 bilhões. E seria criada a Contribuição sobre Grandes Movimentações (CGM), um tributo semelhante à CPMF, mas só para transações superiores a R$ 5 mil. Heranças e doações passariam a pagar mais impostos, o que, nas contas dele, levaria mais R$ 18 bilhões para os cofres da União e R$ 16 bilhões para os dos estados.
Entrevista completa de Mauro Benevides Filho ao Jornal Correio Braziliense
CB - Como será a proposta de Ciro Gomes para a reforma da Previdência?
MF - Estamos discutindo um sistema com três pilares, que deverá ser anunciado em uma ou duas semanas. O primeiro pilar será de assistência social, com LOAS, BPC e renda mínima variável. Vamos pegar quem não contribuiu para o INSS e incluir nesse pilar assistencial, que será bancado pelo Tesouro Nacional. Como não houve contribuição, a responsabilidade não será da Previdência Social. O segundo pilar será diminuir o regime de repartição, porque ele não se sustenta mais, devido à demografia. A relação das pessoas ativas para manter um inativo, que antigamente era seis e hoje é 1,5 no serviço público. Além disso, a expectativa de vida é maior. Antes era de 60 anos e hoje é de 73, e vai crescer. Portanto, para resolver o problema previdenciário, é preciso sair para o regime de capitalização de contas individuais. Esse vai ser o nosso terceiro pilar. Nossa proposta para o regime de repartição é reduzir o teto, de R$ 5,6 mil para um valor menor, que ainda estamos discutindo. Vamos fazer uma convergência dos dois sistemas de aposentadoria, público e privado.
CB - E militares? Eles entram também?
MF - Não nessa primeira etapa. Vão entrar os 840 mil funcionários federais. A proposta atual de reforma teve muita ênfase apenas no Regime Geral (o INSS). O déficit no regime próprio (dos servidores) é de R$ 90 bilhões, e o do INSS é de R$ 182 bilhões, mas o governo esquece que os estados têm déficit de R$ 100 bilhões. Portanto, se somado com os R$ 90 bilhões, o déficit (da Previdência pública) é maior do que os R$ 182 bilhões. E é onde estão os maiores salários. Enquanto a renda média do sistema de aposentadoria do INSS é de R$ 1,2 mil, o Executivo, o Legislativo e o Judiciário têm benefícios de R$ 10 mil para cima.
CB - Mas os servidores que ingressaram em 2013 não estão mais nesse regime e precisam contribuir para o Funpresp.
MF - Os novos servidores já entram em até R$ 5,6 mil, teto que será rebaixado, para o que for, e, obviamente, estão lá no Funpresp, porque aí não tem mais a paridade. Mas ainda temos um problema em relação aos que entraram antes de 2013. Nesse caso, vamos propor um estímulo, talvez pelo Imposto de Renda, para que eles migrem de regime e vão para a capitalização.
CB - Haverá uma idade mínima?
MF - Terá idade mínima no sistema de repartição. No caso da capitalização não é necessário, porque o que vai determinar é tempo de contribuição. Mas isso estamos ajustando. Em tese, é para ter. No entanto, definimos que tenha pelo menos duas idades mínimas, conforme a atividade. O carvoeiro do Pará não tem a mesma expectativa de vida de quem trabalha na Av. Faria Lima, em São Paulo.
CB - Serão vários fundos ou um fundo só?
MF - Tem gente que defende separar o fundo do trabalhador da iniciativa privada do RPPS, mas há quem defenda um fundo só. Isso potencializa a queda da taxa de administração e as taxas de rendimento.
CB - Qual será o efeito fiscal dessa proposta?
MF - O efeito será macroeconômico, e não só atuarial. Além de resolver o problema fiscal, será possível gerar poupança dentro do sistema para financiamento de médio e longo prazos.
CB - Como fazer o ajuste fiscal e melhorar o resultado primário das contas públicas?
MF - Para fazer o ajuste fiscal, primeiro, é preciso explicar melhor para as pessoas o que é isso. A maioria só vende corte, corte, corte. Mas ajuste fiscal é dotar o Estado de condições para atender as demandas da população. É reestruturar o processo educacional, é ter dinheiro para fazer melhor atendimento na área de saúde, é reforçar a estrutura de segurança pública, então, ajuste fiscal não é um fim nele mesmo. É deixar o Estado com condições para investir. Pela nossa proposta, é possível reduzir o déficit em dois anos.
CB - Tem uma coisa que o Ciro fala que assusta o mercado, que o Banco Central vai ter meta de inflação e de emprego, algo que ocorre em países onde a inflação não é mais um problema.
MF - Mas na Alemanha é assim. Isso tem no mundo inteiro. Se o governo conseguir resolver o problema fiscal, é preciso ter simultaneidade. Se o BC tivesse considerado o emprego, a inflação não teria ficado abaixo do piso da meta em 2017. Hoje, o mercado acha que o BC foi muito ortodoxo, errou no calibre.
CB - Mas o que vocês admitem como inflação? É possível admitir inflação no teto da meta?
MF - Trabalharemos com a meta. O que foi acordado com o Congresso e a sociedade foi cumprir a meta. Não tem flexibilização de meta. Meta estabelecida é para ser cumprida. Ciro já disse que vai perseguir a inflação, obviamente, levando em conta o emprego.
CB - E qual seria a meta de emprego?
MF - Ainda não vamos antecipar isso. O importante é o conceito.
CB - O senhor critica o teto de gastos. A solução seria acabar com ele?
MF - Não. Tem que fazer o que fiz no Ceará, desculpe a falta de modéstia. Tem que tirar investimento, controlar o pessoal e a Previdência. Manuel Pires, um colega da Fundação Getúlio Vargas, pesquisou o investimento público de 1947 a 2017, e o resultado é o menor índice do período. Estão assassinando o país, dizendo que essa Emenda Constitucional 95 controla os gastos, mas não está controlando nada. O gasto com Previdência está aumentando!
CB - Quais serão as políticas para a taxação de heranças e doações?
MF - No Brasil, é até 8%. Mas, só quatro estados têm 8%, o restante usa a taxa de 4%. Então, o que vai acontecer? Vamos supor que o imposto de heranças e doações consiga ser aprovado em 20%. Isso tudo para o rico. É imposto sobre herança de R$ 40 milhões, por exemplo. Pode tirar a classe média e baixa disso, isso é para quem tem dinheiro.
CB - O senhor propõe recuperar o CPMF?
MF - Está em análise. Só que esse nome não pode sequer ser falado. Porque o cara que passava um cheque de R$ 50 pagava imposto. Mas existe uma Contribuição sobre Grandes Movimentações (CGM), que retira 86% da população brasileira do tributo. O percentual seria o mesmo, de 0,38%. Mas essa CGM seria para grandes movimentações — o que retira a classe média e a classe baixa.
CB - Seria aplicada em transferências acima de quanto?
MF - Cinco mil reais. A previsão é essa. Não estamos interessados em pequenos saques, mas em grandes movimentações. Creditou salário na sua conta, não paga nada.
CB - E os demais tributos?
MF - Sou a favor da criação do Imposto sobre o Valor Agregado (IVA). O IVA pressupõe o princípio do destino, fica com o imposto quem paga. Hoje, parte fica com o estado produtor, parte com o estado consumidor. Outra coisa que vamos fazer é reduzir o PIS/Cofins e o ICMS.
CB - E as taxas de juros?
MF - O setor privado vive algo muito grave: a rentabilidade do negócio é inferior ao custo de tomar dinheiro no sistema bancário brasileiro. As empresas do Brasil estão muito endividadas. A informação que tenho é que é possível, até dezembro, os bancos colocarem créditos de R$ 600 bilhões no mercado. Dois bancos disseram que isso está em provisionamento. É muito grave. O Brasil tem muita concentração bancária, cinco bancos detêm 83% das transações.
CB - O senhor está muito liberal para um candidato de esquerda…
MF - Não existe social sem fiscal adequado, pode escrever. Não existe política social sem um quadro fiscal ajustado.
Fonte: Jornal Correio Braziliense
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