sábado, 23 de março de 2019

Atenção à infância é efetivada como política pública no Ceará

O programa Mais Infância foi lançado em 2015, mas só ontem foi tornado lei, entrando de forma permanente na agenda do Governo; ações vão desde brinquedopraças até ampliação de creches
Jéssica de Sousa tem 12 anos e se comunica de duas únicas formas: pelo sorriso e pelo olhar. Ambos brilham de uma forma que não há como descrever aqui, boca e olhos abertos, vivos, contagiantes - mais ainda quando escuta a mãe falar sobre o mar. É que ela sentiu a quentura da água salgada e das ondas embalando o corpo pela primeira vez só ano passado, por meio do projeto Praia Acessível para crianças: por causa da microcefalia identificada apenas após o parto, Jéssica tem a mobilidade limitada à cadeira de rodas.
"Levei ela pela primeira vez ao projeto e ela gostou muito. Ela ficou maravilhada, porque nunca ia entrar numa praia e, de repente, estava lá no meio do mar, vendo as ondas. Fiquei muito emocionada, até chorei! Achei muito lindo, porque é muito difícil uma criança como ela ter acessibilidade a lazer aqui em Fortaleza", declara a dona de casa Maria Roseli Silva, 51, mãe da menina.
A garantia de lazer, sobretudo a famílias em vulnerabilidade socioeconômica, é um dos eixos do programa Mais Infância, existente desde 2015, mas sancionado como política pública de Estado por lei apenas ontem, no Palácio da Abolição. O programa, idealizado pela primeira-dama, Onélia Santana, tem quatro eixos principais: Tempo de Nascer, com foco no cuidado materno-infantil; Tempo de Crescer, que visa fortalecer vínculos familiares e sociais; Tempo de Aprender, cuja meta é ampliar o acesso a creches e pré-escola; e Tempo de Brincar, com ações para o desenvolvimento físico, cognitivo e emocional das crianças por meio do lúdico.
Brincar
Este último, aliás, é o eixo mais destacado, devido à implantação de 76 equipamentos chamados "Brinquedopraças" - uma delas inaugurada no mês passado no bairro Conjunto Ceará, para alívio da dona de casa Gleiciane Souza, 26. Segundo ela, os filhos João Pedro, 3; Bryan, 5; e Estéfane, 8, "não tinham pra onde ir" para brincar com segurança. "De primeiro, eles ficavam praticamente só dentro de casa. Hoje, falam que a melhor coisa que teve foi os brinquedos na praça", diz.
Moradora do mesmo bairro, a dona de casa Elis Regina, 37, também leva os filhos para usufruírem da praça, "cercado" que previne os pequenos da insegurança pública que ronda parte da região. "Todos os dias vou buscar minha filha na escola, paro lá e fico mais ou menos uma hora com ela. Antes só tinha um balanço quebrado, faltava essa atenção", aponta.
A professora doutora da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Ceará, Cristiane Amorim, destaca a importância desses espaços para o desenvolvimento infantil, sobretudo na periferia. "Há muita discrepância entre as condições oferecidas pelos espaços públicos nos diferentes bairros da nossa cidade. Infelizmente, em grande parte da periferia não se tem sequer calçadas, imagina espaços de lazer projetados para as brincadeiras infantis. Penso que esses locais, além de acervos de livros infantis, são ideias interessantes".
A especialista pontua, ainda, a relação entre as atividades lúdicas e o desempenho escolar na infância. "Uma boa aprendizagem dentro e fora da escola pressupõe boas condições de desenvolvimento, e o brincar favorece o desenvolvimento cognitivo, social e psicomotor. Porém, ele não deve ser visto enquanto estratégia para melhorar o desempenho escolar", salienta Cristiane Amorim.
Durante solenidade de sanção da lei do Mais Infância, Onélia Santana informou que a meta da gestão é inaugurar 140 Brinquedopraças até 2022, mas ressaltou a importância de outra ação "invisível" do programa: as visitas domiciliares a famílias em situação de vulnerabilidade, incluídas no eixo "Tempo de Crescer". De acordo com a primeira-dama, 51 mil famílias em 182 municípios cearenses recebem esse acompanhamento, das quais 9 mil têm gestantes.
Saúde
Além de acompanharem as condições em que as crianças cearenses vivem, em termos de segurança afetiva, social, alimentar e educacional; os "visitadores" alertam a família para os cuidados necessários com a infância e a aproximam das políticas públicas.
Um maior cuidado desde a gravidez teria prevenido a dona de casa Jaqueline Santos, 28, de uma surpresa: somente após o nascimento de Ketlyn Vitória, 3, a mãe soube que ela tinha Síndrome da Zika Congênita, efeito da arbovirose contraída por Jaqueline no quarto mês da gestação. Para tratamento, largou o plano particular e passou a levar Keltyn ao Núcleo de Estimulação Precoce da policlínica de Caucaia, um dos frutos do Mais Infância.
"Ela chega lá, interage, já conhece os profissionais. Queria que fossem mais dias e mais tempo, porque só vamos duas vezes por semana. Sei que é algo gradativo, as evoluções são pequenas, mas é gratificante. Meu sonho é que ela ande, fale e tenha uma vida o mais normal possível", emociona-se.
Fonte: Portal DN

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