José Dirceu |
Claro que é e sempre foi necessário combater o tráfico de drogas. Mas de quem é a função do combate ao tráfico de drogas e ao contrabando, por exemplo?
A Segurança Pública é responsabilidade dos Estados, das polícias civis e militares. O combate ao tráfico de drogas e ao contrabando, muitos já esqueceram, é atribuição da Polícia Federal, que é a polícia judiciária da União.
Então, por que convocar Forças Armadas? As Forças Armadas podem e devem ser convocadas em determinadas situações? Claro que sim. E já foram, na Eco 92. E nós temos experiências ruins da participação das Forças Armadas no combate ao tráfico de drogas. Como o caso do Borel, ainda no governo Itamar em 94, com graves violações dos direitos humanos.
Por que chegamos a esse ponto?
Porque há uma falência do Estado no Rio de Janeiro, inclusive de suas polícias civil e militar. Sucateadas, com os salários atrasados. Evidente que o problema da Segurança Pública se agrava. Se o Estado está falido, inclusive em grande parte por causa das consequências da lava a jato, tem a sua indústria de óleo e gás paralisada, a construção naval, se cessam os investimentos em saneamento em habitação do Minha Casa Minha Vida, a construção civil entra em crise. Se corta gasto em área como da Saúde e da Educação.
Os resultados são evidentes, desorganização da Segurança, desorganização dos serviços públicos, falência da autoridade do Estado. O crime organizado, os chefetes do tráfico de droga, as organizações criminosas como o Comando Vermelho tomam conta do Estado.
Mas o Rio não é o Estado mais violento do país. O Rio é o décimo segundo Estado em muitos crimes, inclusive homicídio. Apesar disso, mais de seis mil cidadãos são mortos no Rio por ano, inocentes em sua maioria. Já se combate o crime, inclusive com execuções, com a pena de morte extrajudicial. Essa é uma verdade que todos nós conhecemos.
As causas são essas. Inclusive a causa maior, que é a penalização e criminalização do uso da droga, do usuário. O aumento das penas, o encarceramento em massa sem condições penitenciárias, com presídios controlados pelo crime organizado. Essa dupla ameaça que é criminalizar o uso da droga, aumentar penas e abandonar o sistema penitenciário significa maior força para o crime organizado.
As Forças Armadas combatem o inimigo, ocupam o território, derrotam o exército inimigo. As funções das Forças Armadas são claras, elas devem, antes de mais nada, defender a soberania nacional, o território nacional, o povo brasileiro, os seus interesses nacionais. E não combater o crime, o tráfico de drogas, o crime organizado, os PCCs das vida.
Os riscos são grandes. As Forças Armadas não solucionarão o problema. Trata-se de uma intervenção e não se trata de se opor, de culpar as Forças Armadas. E sim de mostrar que ela não resolverá o problema.
Mas então fica uma pergunta: por que o governo adotou uma solução tão drástica, tão grave, tão perigosa? Por que o governo colocou as Forças Armadas? Porque ela tem que obedecer a ordem do presidente da República nessa situação. O pior é que o governo fez por razões políticas. Para fugir da pauta negativa e derrotada da Previdência. Para fugir das acusações que são feitas diariamente nos meios de comunicação ao presidente da República, inclusive agora com foco na questão da Rodrimar, que a TV Globo, todos os dias, anunciava em rede nacional à noite.
A razão é mudar a agenda e a pauta eleitoral. Sair da política econômicos e dos problemas sociais, porque aí as forças políticas democráticas, nacionalistas, de esquerda, socialistas, vencem o governo e a direita brasileira. A pauta deles é a ordem pela repressão, insinuando uma intervenção militar. É a pauta da ordem, dos bons costumes, da defesa da família, é a pauta da direita. E é uma tentativa equivocada, fugaz, de fugir dos problemas do país.
Infelizmente, a decisão está tomada. A maioria do Congresso vai aprovar. As Forças Armadas devem estar pensando já em como sair dessa situação. Porque ela não pode iniciar uma guerra interna contra parcelas do povo brasileiro. Porque pela força militar armada só há uma maneira de derrotar o inimigo. Ocupando o território inimigo, afastando a população civil, muitas vezes com graves consequências para a população civil e destruindo o exército inimigo. É uma ilusão pensar que os membros das facções criminosas do Rio, seja do Comando Vermelho ou não, seja do PCC ou não, temem a guerra. Eles fazem a guerra.
Portanto, melhor faria o governo se tivesse tomado a decisão de construir um plano de desenvolvimento para o Estado do Rio, de recuperação para o Estado do Rio e dentro desse plano, reestruturar a polícia civil e militar. E dentro desse plano, ter um projeto social, um projeto econômico de desenvolvimento local para essas chamadas comunidades. E ter uma política, principalmente, social de crescimento econômico junto com uma nova política de Segurança Pública.
Mas, não. O que nós assistimos é o sucateamento da polícia civil e militar e não vejo como uma intervenção das Forças Armadas pode solucionar.
Portanto, vamos, não nos opor às Forças Armadas que estão cumprindo uma ordem presidencial. Mas, sim ao erro grave, e pior, ao uso e abuso das Forças Armadas com fins eleitorais. Com fins de manutenção do atual grupo golpista no poder.
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